Artigo de Opinião – Direito ao Esquecimento
Nelson Soares – Assessor na Comarca de Setúbal
A acumulação de dados tem vindo a crescer exponencialmente desde a invenção da tipografia mas, o seu verdadeiro “boom” deu-se com a Internet, nunca antes na história da humanidade se viu a produção massiva de dados partilhados, sendo que tais dados estão muitas vezes relacionados com pessoas específicas, que podem não estar de acordo com o conteúdo disponibilizado publicamente. Tal situação, levanta muitas questões, entre as quais, até quando um determinado conteúdo partilhado pode estar disponível, uma vez que nesta nova era da informação, qualquer pessoa, com recurso a um computador ou smartphone, facilmente pode atentar contra os direitos fundamentais à intimida – de, imagem, honra e vida privada de outra.
Será que os cidadãos não têm direito ao esquecimento, no âmbito do respeito da sua vida privada, prevista na maioria dos catálogos constitucionais de direitos e liberdades fundamentais? Ainda que o direito ao esquecimento não se destine apenas à Internet, pois existe toda uma cadeia de meios de comunicação também importante, na verdade, verifica-se que o ambiente digital veio alterar o paradigma existente, onde o convívio com as mais variadas plataformas virtuais, proporciona, sem restrições, a disponibilização de dados e informações pessoais sem justificação.
Esta nova dinâmica mundial “online”, onde atrás de uma qualquer máscara/anonimato se torna possível publicar conteúdos nocivos à vida de terceiros, este cenário, veio aportar a necessidade de consagração do direito ao esquecimento nas legislações nacionais.
O direito ao esquecimento, pese embora não seja um conceito novo, ganhou uma nova dimensão no mundo digital. A internet e os motores de busca tornaram a informação, incluindo os dados pessoais do passado dos cidadãos alvos, que ficam facilmente acessível e podem potenciar risco de prejudicar a reputação da sua vida privada.
A decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia em 2014, relativa ao caso Google Spain, surge como um marco na consagração do direito ao esquecimento no contexto digital. Neste, o tribunal reconheceu o direito dos indivíduos a solicitar a remoção de links para informações desatualizadas ou irrelevantes sobre si mesmos dos resultados dos motores de busca.
A decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia considerou que os direitos fundamentais à privacidade, consagrados nos artigos 7º e 8º da Carta dos Direitos Fundamentais da UE, prevalecem, em princípio, sobre o interesse económico do operador do motor de busca sobre o interesse público em aceder à informação. No entanto, o tribunal também reconheceu que esta prevalência pode ser relativizada em casos de figuras públicas, onde o interesse público em aceder à informação pode justificar a manutenção dos links nos resultados da pesquisa.
Podendo concluir-se que, já existe a possibilidade, para o comum dos cidadãos de solicitar que os seus dados sejam retirados ou atualizados pelos operadores de motores de busca, sempre que tal informação não se revele com importância para o público.
In, Jornal “O SETUBALENSE”, de 20 de dezembro de 2024